Uma breve reflexão sobre Lucas 15.
Em
Lucas 15, como às vezes pregado e ensinado, não há 3 parábolas. O verso 3 expõe
o que temos ali. Diz o referido verso: "Então ele lhes propôs esta
parábola." Note não propôs parábolas; propôs parábola (singular), então é
uma só.
Pois
bem, a primeira parte da parábola enfoca uma ovelha, enquanto a segunda parte,
enfoca uma dracma.
A OVELHA
é um animal peculiar ao judeu. Desde que Israel foi para o Egito, nos dias de
José, eles foram posicionados na terra do Egito como pastores de ovelhas, o que
era uma abominação aos egípcios (Gen 46:34).
O próprio Senhor Jesus fez
referência a Israel como ovelha quando disse:
"Não fui enviado senão às ovelhas
perdidas da casa de Israel" (Mat 15:24).
E outra vez:
“Jesus enviou estes
doze, e lhes ordenou, dizendo: Não ireis pelo caminho dos gentios, nem
entrareis em cidade de samaritanos; mas ide antes às ovelhas perdidas da casa
de Israel” (Mat 10:5,6).
Então nestas escrituras acima, Israel é
caracterizado figurativamente como ovelha.
Por
outro lado, a "DRACMA" não tem nada a ver com o judeu. A dracma é uma
moeda grega, o que representa o gentio. Em Romanos 1 temos isto em perfeita
ordem. Paulo escreveu ali que: "ele não se envergonhava do evangelho, porque
é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê; primeiro do judeu,
e também do grego."
"PRIMEIRO
DO JUDEU, E TAMBÉM DO GREGO." Observe esta expressão! Não confere com as
duas figuras iniciais de Lucas 15? Então, entendo que é disto que a parábola
está falando.
A
conversa que gerou está parábola é esta:
“E CHEGAVAM-SE a ele todos os PUBLICANOS E PECADORES para o
ouvir. E os FARISEUS E OS ESCRIBAS murmuravam, dizendo: Este recebe pecadores,
e come com eles” (Luc 15:1,2).
Então o diálogo entre o
Senhor e os publicanos e pecadores, suscitou nos “noventa e nove justos” este
questionamento. Por isso a parábola foi exposta de forma completa, detalhada e
não resumida.
Nela o Senhor expõe o evangelho que haveria de ser pregado, bem
como, seu alcance. Judeus e gentios ou ovelha e dracma seriam os alvos e são
postos em cena nesta alegoria, tal como a forma como ambos seriam alcançados.
Assim nela temos em figura em primeiro plano o Senhor (aquele que
foi após a perdida, Israel) e o Espírito Santo (aquele que acende a candeia,
varre a casa e busca até encontrá-la, o gentio).
Nos dois filhos, o mais novo (publicanos e pecadores) e o mais
velho (fariseus e escribas), temos o relacionamento pessoal do Senhor naquele
tempo. João escreveu que Ele “veio para o que era seu, mas os seus não o
receberam. Mas, a
todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos
que creem no seu nome” (Jo. 1:11,12).
Os acontecimentos
futuros, como registrado em Atos, especialmente, nos capítulos 11,13,14 e 15,
descrevem a forma como no princípio foram recebidos em casa.
Assim observem
o diálogo entre o pai e os dois filhos. O mais velho representa os noventa e
nove justos que não precisam de salvação, o mais novo os que são salvos.
O
mais novo nos fala tanto da ovelha como da dracma perdida, e sabendo que o
Senhor veio salvar os pecadores, tanto judeus como gentios se enquadram entre
eles.
O
Senhor, repetindo suas próprias palavras referidas acima, não foi enviado senão
as ovelhas perdidas da casa de Israel; no entanto, enviou os seus com esta
mensagem:
"Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a
observar todas as coisas que eu vos tenho mandado" (Mat 28:19,20).
Porque Ele mesmo não fez isto? Porque
existia algo terrível entre Deus e o homem e sua salvação. Havia uma sentença
de morte. Deus ordenou a Adão:
“De toda a árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore
do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela
comeres, CERTAMENTE MORRERÁS” (Gên. 2:16,17).
A humanidade estava por causa do
pecado debaixo de uma sentença de morte. Portanto, um pecador morrendo, somente
receberia a punição, sentença aplicada aos seus pecados, então o que fazer? Nada!
Impossível redimir-se.
O salmista escreveu:
“Nenhum deles de modo algum pode remir a seu irmão, ou dar a
Deus o resgate dele (Pois a redenção da sua alma é caríssima, e cessará para
sempre)” (Sal 49:7,8).
O quadro era aterrador, não havia
saída para o homem em si mesmo. Em todas as direções só se via pecado,
transgressão. Do outro lado uma justiça implacável, imparcial, a justiça de
Deus. Falando desta justiça o profeta registrou:
“O Senhor é um Deus zeloso e vingador; o Senhor é vingador e
cheio de indignação; o Senhor toma vingança contra os seus adversários, e
guarda a ira contra os seus inimigos. O Senhor é tardio em irar-se, e de grande
poder, e AO CULPADO DE MANEIRA ALGUMA TERÁ POR INOCENTE” (Naum 1:2,3).
Diante desta exigência o que fazer? É
necessário encontrar um substituto, alguém sem pecado, um santo, alguém que
satisfizesse esta justiça. Aí entra em cena o amor de Deus. Se Ele é justo, Ele
também ama o pecador. Para mim a frase mais linda e preciosa que a minha mente
pode conceber é esta: “Deus (apesar do que sou como pecador) não desistiu de
mim, não desistiu de você”. Ele me ama, ama você também. O profeta Isaias
escreveu:
“TRAZEI MEUS FILHOS DE LONGE, e minhas filhas das
extremidades da terra; a todo aquele que é chamado pelo meu nome, e QUE
CRIEI PARA MINHA GLÓRIA, e que formei e fiz” (Isa 43:7,8).
Como soa refrescante em nossos
corações estas doces palavras. Podemos agregar muitas outras como estas:
“Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por
nós, sendo nós ainda pecadores, ” (Rom 5:8).
“Nisto está o amor,
não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou a nós, e enviou
seu Filho para propiciação pelos nossos pecados” (1 Jo 4:10).
Eu e você carecíamos de um substituto, de alguém para morrer em nosso lugar, mas alguém
que não tinha sobre si a sentença de morte, alguém que não tinha pecado. Deus deu este substituto, deu seu Filho Amado:
“Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho
unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida
eterna” (Jo 3:16).
A salvação
dos pecadores somente deveria ser proclamada sobre uma base sólida, segura e
estável. Por esta razão o Senhor a comissionou aos homens, embora como diz o
escritor aos Hebreus, Ele foi quem primeiramente a anunciou (Heb 2:3).
A justiça
de Deus requer a morte do pecador e o Senhor Jesus morreu no seu lugar. A
escritura afirma: “Cristo morreu pelos pecados, o justo pelos injustos, para
nos levar a Deus” (1 Pe 3:18). Preciosa verdade! Judeu e gentio agora podem ser
salvos, se pela fé, arrependidos, confessando seus pecados, confiarem no Senhor
Jesus como seu Senhor e Salvador.
O
evangelho de Cristo só podia ser pregado debaixo desta sustentação. Por isso
Ele se dispôs a morrer no lugar do pecador. Ele foi a cruz rasgar o escrito de
dívida que era contra o pecador (Col 2:13,14).
Estando
ausente como o sustentador daquilo que Ele mesmo fez, comissionou aos pecadores
salvos a nobre tarefa de proclamar o evangelho. Ele mesmo como escreveu Marcos “cooperou
com eles confirmando a palavra com os
sinais que se seguiram” (Mar 16:20).
A salvação e a agregação de
qualquer pecador ao plano inicial de Deus, devido a entrada do pecado, exigia o
pagamento de um alto preço, e na cruz do calvário, o
Senhor Jesus o pagou para a redenção de todo aquele que crê.
Portanto, havia necessidade de redenção e Ele estava aqui para
fazê-la. Como é precioso o que escreveu Paulo em Efésios 1:7 e Colossenses 1:14,
no primeiro lemos:
“Em quem temos a
redenção pelo seu sangue, a remissão das ofensas, segundo as riquezas da sua
graça.”
E no segundo:
“Em quem temos a
redenção pelo seu sangue, a saber, a remissão dos pecados.”
Somente depois que o Senhor Jesus
ressuscitou é que o evangelho foi ordenado a ser pregado a todo mundo. Primeiro
a justiça tinha que ser estabelecida, e para isto a sentença de morte tinha que
ser aplicada, executada e, então, lemos:
“Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura.
Quem crer e for batizado será salvo; mas quem não crer será condenado” (Mar
16:15,16).
Até então, como disse acima, não
havia redenção, salvação a ser pregada. Foi Ele mesmo quem fez a redenção. Ele mesmo
que morreu. Paulo escreveu aos coríntios nestes termos:
“Vos notifico, irmãos, o evangelho que já vos tenho anunciado...
pelo qual também sois salvos... que
Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado, e
que ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras” (1 Cor 15:1-4).
Continuando na observação dos detalhes da parábola, entendemos
pelos registros apontados que o pai jamais desviou seu olhar daquela cena onde
o filho mais novo desapareceu. O Senhor disse:
“Quando ainda estava
longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe
ao pescoço e o beijou” (Luc 15:20).
Na epístola de Paulo a Timóteo e na 2
epistola de Pedro encontramos a resposta para o posicionamento do Pai,
especialmente, sobre o fato de nunca ter desviado seu olhar nem dado sono aos
seus olhos, desde que o filho desapareceu, seja numa montanha ou numa curva.
Em
primeira Timóteo 2:3,4 lemos que:
"Deus nosso Salvador... deseja que todos os homens sejam
salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade."
Em 2
Pedro 3:9 lemos também:
"O Senhor... é
longânimo para convosco, não querendo que ninguém se perca, senão que todos
venham a arrepender-se."
Assim,
quando chegamos ao livro de Atos temos o desenrolar daquilo que se passou em
figura na experiência de ambos, isto é: pai, filho mais novo e filho mais
velho.
As
narrações de Lucas obedecem ao mesmo princípio do seu evangelho e estão
distribuídas neste livro, segundo minha visão, assim:
Primeiro
o evangelho foi pregado aos judeus, com a promessa de chegar aos confins da
terra (Atos 1:8). Enquanto o evangelho era pregado somente aos judeus houve
alguns distúrbios de pequena monta, (exceto o caso de Estevão).
Mas
quando o evangelho foi levado aos gentios, a partir de Atos 8, os distúrbios
aumentaram numa elevada proporção. Assim a pregação do evangelho para fora dos
termos de Israel, onde a dracma foi varrida e encontrada, ocorreu após início da
perseguição de Estevão (Atos7 e 8).
"Naquele dia levantou-se grande perseguição contra a
igreja que estava em Jerusalém; e todos exceto os apóstolos, foram dispersos
pelas regiões da Judeia e da Samaria...
E os que foram
dispersos pela perseguição que sucedeu por causa de Estêvão caminharam até
à Fenícia, Chipre e Antioquía, não anunciando a ninguém a palavra, senão
somente aos judeus.
E havia entre eles
alguns homens cíprios e cirenenses, os quais entrando em Antioquía falaram aos
gregos, anunciando o Senhor Jesus...
Mas os judeus incitaram as mulheres devotas de alta posição e
os principais da cidade, suscitaram uma perseguição contra Paulo e Barnabé, e
os lançaram fora dos seus termos" (Atos 8:1; 11:19,20;
13:50).
Então
o que temos relativo à propagação do evangelho fora dos limites de Jerusalém,
começou com o martírio de Estevão. Devido aquela perseguição cumpriu-se o que
havia sido dito pelo Senhor aos seus, quando lhes falou do Espírito Santo e que
pelo seu poder eles seriam suas testemunhas, começando em Jerusalém e indo até
os confins da terra.
Então
devido a perseguição eles saíram fora dos termos de Jerusalém, e no capítulo 11
de Atos temos o relato de Pedro acerca de como o evangelho alcançou Cornélio, e
nos relatos finais o evangelho chega a Antioquía e ali ouvimos de outros que
também creem no evangelho. Agora em verso 20 lemos de cíprios e cirenenses
pregando aos gregos e estes crendo também. A notícia destes acontecimentos
chega a Jerusalém e eles enviam Barnabé para lá.
Estes
fatos fazem-nos lembrar de Lucas 15 onde o filho mais velho (figura dos judeus)
não concorda com o perdão dado ao filho pródigo (figura dos que se
arrependem).
Algo
semelhante é visto aqui nesta parte da parábola de Lucas 15. Em Lucas 15:32 o
problema foi resolvido com estas palavras:
"Mas era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu
irmão estava morto, e reviveu; e tinha-se perdido, e achou-se".
O
mesmo ocorreu também em Atos 11:17quando Pedro também disse:
"Quem era então eu, para que pudesse resistir a
Deus?"
Em
continuação lemos que os dispersos seguiram anunciando o evangelho somente aos
Judeus:
"E os que foram dispersos pela perseguição que sucedeu a
Estêvão caminharam até à Fenícia, Chipre e Antioquía, não anunciando a ninguém
a palavra, senão somente aos judeus (Atos 11:19).
Pois bem,
embora temos conversão de gentios, o evangelho é centralizado nos judeus e isto
sucede até que eles sejam declarados como aqueles que rejeitaram o evangelho.
Em cap. 13:46 lemos:
"Mas Paulo e Barnabé, usando de ousadia, disseram: Era
mister que a vós se vos pregasse primeiro a palavra de Deus; mas, visto que a
rejeitais, e não vos julgais dignos da vida eterna, eis que nos voltamos para
os gentios."
Foi
neste período de grande conturbação que Deus chama um homem, Paulo, para ser
este instrumento, e quando Barnabé foi para Antioquía associa-se consigo a
Paulo nesta pregação e ensino do evangelho aos que creram. Os versos finais nos
contam deste trabalho conjunto de Barnabé e Paulo, seja ensinando (vs 26), seja
socorrendo (vs 29,30).
Resumindo
o nosso texto para não ficar cansativo, lemos nos capítulos 11,13,14 e15 que depois desta resistência dos judeus à conversão dos gentios,
houve uma reunião (concilio) em Jerusalém para solucionar este problema.
"Ora, ouviram os apóstolos e os irmãos que estavam na
Judeia que também os gentios haviam recebido a palavra de Deus.
E quando Pedro subiu a Jerusalém, disputavam com ele os que
eram da circuncisão, dizendo: Entraste em casa de homens incircuncisos e comeste
com eles" (Atos 11:1-3).
"Mas os judeus, vendo as multidões, encheram-se de inveja
e, blasfemando, contradiziam o que Paulo falava.
Mas os judeus incitaram as mulheres devotas de alta posição e
os principais da cidade, suscitaram uma perseguição contra Paulo e Barnabé, e
os lançaram fora dos seus termos" (Atos 13,:45,50).
"Mas os judeus incrédulos excitaram e irritaram os ânimos
dos gentios contra os irmãos... E se dividiu o povo da cidade; uns eram
pelos judeus, e outros pelos apóstolos. E, havendo um motim tanto dos gentios
como dos judeus, juntamente com as suas autoridades, para os ultrajarem e
apedrejarem...
Sobrevieram, porém, judeus de Antioquía e de Icônio e, havendo
persuadido as multidões, apedrejaram a Paulo, e arrastaram-no para fora da cidade,
cuidando que estava morto" (Atos 14:2,4,5,19).
“Tendo tido Paulo e
Barnabé não pequena discussão e contenda contra eles, resolveu-se que Paulo e
Barnabé, e alguns dentre eles, subissem a Jerusalém, aos apóstolos e aos
anciãos, sobre aquela questão...
E, quando chegaram a
Jerusalém, foram recebidos pela igreja e pelos apóstolos e anciãos, e lhes
anunciaram quão grandes coisas Deus tinha feito com eles...
Congregaram-se,
pois, os apóstolos e os anciãos para considerar este assunto.
E,
havendo grande contenda, levantou-se Pedro e disse-lhes: Homens irmãos, bem
sabeis que já há muito tempo Deus me elegeu dentre nós, para que os gentios
ouvissem da minha boca a palavra do evangelho, e cressem...
Então
toda a multidão se calou e escutava a Barnabé e a Paulo, que contavam quão
grandes sinais e prodígios Deus havia feito por meio deles entre os gentios.
E,
havendo-se eles calado, tomou Tiago a palavra, dizendo: Homens irmãos, ouvi-me:
Simão relatou como
primeiramente Deus visitou os gentios, para tomar deles um povo para o seu
nome...
Por isso julgo não
se deve perturbar aqueles, dentre os gentios, que se convertem a Deus...
Então pareceu bem aos apóstolos e aos anciãos com toda a
igreja escolher homens dentre eles e enviá-los a Antioquia com Paulo e Barnabé...
E, quando a leram, alegraram-se pela consolação" (Atos
15:2,4,6,7,12-14,19, 22,31).
Os
fatos narrados acima de capítulos 11 a 14 mostram a inimizade ou resistência do
filho mais velho contra o mais novo.
Em
capitulo 15 temos o tribunal da igreja em Jerusalém, para discussão destes
assuntos o que prefigura a conversa do pai com o filho mais velho.
Assim,
a análise criteriosa destes acontecimentos, sintetizam o que o Senhor expôs na
parábola de Lucas 15.
Como
citei de Romanos 1:16, que “ o evangelho é o poder de Deus para a salvação de
todo que crê; primeiro do judeu e também do grego (o gentio)”; os fatos
transcritos acima demonstram de forma muito clara esta verdade preciosa dos
propósitos de Deus, e assim confirma aquilo que o apóstolo Paulo escreveu em Romanos
11:29: “Porque os dons e a vocação de Deus são sem arrependimento.”
JCarneiro.