“TEM CUIDADO DE TI MESMO
E DA DOUTRINA”.
UMAS PALAVRAS AOS QUE TRABALHAM NA OBRA DO SENHOR
“Tem cuidado de ti
mesmo e da doutrina; persiste nisto, pois fazendo isto, te salvarás a ti mesmo e
aos que te ouvem” (1.ª Timóteo 4:16).
Antes
de entrar em detalhes sobre o tema acima, desejo advertir aos leitores, que o
termo que usamos como obreiro não é designativo de uma classe clerical eleita e
nomeada para tal, não importando o nome que utilizam, o que não tem amparo nas
escrituras, mas usamos a palavra para referenciar àqueles que trabalham na obra
do Senhor, nas várias localidades, sem possuírem título algum, e sem qualquer
filiação a nenhum tipo de entidade, dependendo apenas da graça de Deus para
cumprirem seu ministério (Atos 14:26; 15:40).
Voltemos
ao nosso tema. As palavras do texto citado são muito solenes e devem ser
pesadas por todos aqueles que têm que apresentar às almas a Palavra de Deus e a
doutrina. O inspirado apóstolo dirige estas palavras a seu amado filho Timóteo,
as quais contém a mais preciosa instrução para cada um dos que são chamados por
Deus para ministrar na igreja ou para pregar o Evangelho. Com toda segurança,
tomar parte em tal ministério é um santo e elevado privilegio; mas, ao mesmo
tempo, aquele que o exerce tem uma enorme responsabilidade.
A passagem
citada na epígrafe expõe diante do obreiro do Senhor os deveres sumamente
importantes; deveres absolutamente essenciais aos quais deve prestar atenção com
diligente oração e vigilância, se quer ser um obreiro útil na Igreja de Deus, um
“bom ministro de Jesus Cristo” (1.ª Timóteo 4:6). Primeiramente, deve cuidar de
si mesmo, e depois cuidar do ensino ou doutrina.
1. “Tem cuidado de
ti mesmo”.
Consideremos
em primeiro lugar este solene mandato: “Tem cuidado de ti mesmo.” Seria difícil
expressar todo o alcance moral destas palavras. É importante que todo crente as
observe, mas principalmente um obreiro do Senhor, pois, especificamente a estes,
são dirigidas em particular. Ele, mais que qualquer outro, necessita cuidar de si
mesmo. Deve cuidar do estado de seu coração, da sua consciência, do seu homem
interior. Deve conservar-se “puro” (1.ª Timóteo 5:22). Seus pensamentos, seus afetos,
seu espírito, seu caráter, sua linguagem, tudo deve ser mantido sob o santo controle
do Espírito e da Palavra de Deus. É necessário que esteja cingido com a verdade
e vestido com a couraça da justiça. Sua condição moral e seu andar prático devem
concordar com a verdade que ministra; do contrário, o inimigo, com segurança, ganhará
vantagem sobre ele.
O
mestre deveria ser a expressão viva do que ensina; isto deveria ser o objetivo
perseguido por ele com sinceridade, com veemência e com perseverança. É desejável
que esta santa medida esteja constantemente diante “dos olhos de seu entendimento
(lit. coração)” (Efésios 1:18). Infelizmente, os mais experimentados cometem
faltas e permanecem sempre abaixo deste padrão; contudo, se seu coração for
sincero, se sua consciência é delicada, se o temor de Deus e o amor de Cristo ocupam
nele seu devido lugar, o obreiro do Senhor não se sentirá satisfeito com nada
que abaixo da medida divina, seja em seu estado interior ou em seu andar
exterior. Em todo tempo e em todo lugar, seu ardente desejo será manifestar em sua
conduta o efeito prático de seu ensino, e ser “exemplo dos crentes na palavra, na
conduta, no amor, no espírito, na fé e na pureza” (1.ª Timóteo 4:12). E quanto
ao seu ministério, todo obreiro do Senhor deveria poder dizer: “Não pregamos a nós mesmos, mas a Jesus Cristo
como Senhor, e a nós como seus servos por amor de Jesus” (2.ª Coríntios 4:5).
No
entanto, jamais devemos perder de vista a importante realidade moral de que o
mestre deve viver a verdade que ensina.
Moralmente, é extremamente perigoso que um homem ensine em público o que sua
vida privada desmente — perigoso para si mesmo, desonroso para o testemunho e prejudicial
para aqueles aos quais ensina —. Quão deplorável e humilhante é para um homem, quando
contradiz com sua conduta pessoal e sua vida doméstica a verdade que apresenta publicamente
na igreja! Isto é algo que ele deve temer sobremaneira e que trará indefectivelmente
os mais funestos resultados.
Que
o firme propósito e o sincero anelo de todos os que ministram a Palavra e apresentam
a doutrina, seja, pois, o de alimentar a si mesmo com a preciosa verdade de Deus,
de apropriar-se dela, de viver e mover-se em sua atmosfera, de modo que seu homem
interior seja fortalecido e formado por ela; que ela habite ricamente nele, e
que desse modo possa correr para os outros com seu vivo poder, sabor, unção e plenitude.
É
algo muito pobre, e inclusive muito perigoso, sentar-se ante a Palavra de Deus
como um mero estudante, com o objetivo de preparar estudos ou sermões para pregar
aos outros. Nada poderia ser mais fatigoso ou dessecante para a alma. O uso
meramente intelectual da verdade de Deus, acumular na memoria certas doutrinas,
pontos de vista e princípios, e depois expô-los com alguma facilidade de palavras,
é por sua vez desmoralizador e enganoso. Poderíamos estar extraindo água para
os outros e ao mesmo tempo ser, nós mesmos, como canos enferrujados. Não há
nada mais triste que isto. O Senhor disse: “Se alguém tem sede, vem a mim e beba”. Não disse extraia a água. A verdadeira fonte e o poder de todo ministério na Igreja,
será sempre encontrado ao beber nós mesmos da agua viva e não ao extraí-la para
os demais. O Senhor segue dizendo: “Aquele que crê em mim, como diz a
Escritura, do seu interior correrá rios de água viva” (João 7:37-38). É necessário
que permaneçamos bem próximos da fonte eterna, do coração de Cristo, e beber
dela continuamente longos goles. Desse modo nossas próprias almas serão
refrescadas e enriquecidas; rios de benção correrão delas para refrigério dos
demais, e os sacrifícios de louvores subirão ao trono e ao coração de Deus por Jesus
Cristo. Este é o ministério cristão; o cristianismo mesmo; e qualquer outra coisa
carece absolutamente de valor.
2. “Tem cuidado da doutrina”.
Detenhamo-nos
agora por um momento no segundo ponto de nosso tema; refiro-me à doutrina ou ao
ensino; esta última palavra expressa o
verdadeiro sentido do original. Quantas coisas se encontram encerradas ali! “Tem
cuidado do ensino.” Que solene advertência! Quanto cuidado e que santa vigilância
é requerida! Quanto necessitamos esperar em Deus com oração e com perseverança,
para saber o que devemos dizer e a maneira como
dizê-lo! Só Deus conhece o estado e a necessidade das almas. Nós não
sabemos o que necessitam. Poderíamos oferecer “alimento sólido” aos que só são capazes
de “beber leite”, e assim causar-lhes muito prejuízo. O apóstolo disse: “Se alguém
fala, fale como os oráculos de Deus” (1.ª Pedro 4:11). Não disse: «Fale conforme os oráculos ou as palavras de Deus»,
(como se lê em algumas versões). Um homem pode levantar na igreja e falar
durante uma hora, estando cada uma de suas palavras em estrito acordo com a
letra das Escrituras, e, no entanto, não haver falado de nenhum modo como
oráculo de Deus - como mensageiro ou porta-voz de Deus—. Pode ter apresentado a
verdade, mas não a verdade que necessitava nesse momento.
Tudo
isto é muito solene e nos faz sentir a seriedade da advertência do apóstolo: “Tem
cuidado do ensino”! Que urgente necessidade temos de ser despojados de nós mesmos,
para depender por completo do poder e da direção do Espírito Santo! Nisto
estriba o precioso segredo de todo ministério eficaz, seja oral ou escrito. Alguém
poderia falar durante horas e escrever muitos volumes sem dizer ou escrever
nada que seja ante escriturário, mas se não o fizer no poder do Espírito, suas palavras
só serão metal que ressoa ou címbalo que retine, e seus volumes um montão de
papel velho. Necessitamos permanecer mais aos pés do Mestre e bebermos mais do seu
Espírito; é necessário estar em comunhão com seu coração pleno desse amor que Ele
tem pelos preciosos cordeiros e ovelhas de seu rebanho. Então nossas almas
estarão em condições de dar o alimento no tempo conveniente.
Só
o Senhor sabe exatamente o que os seus amados necessitam a cada instante. Nós até
poderíamos sentir profundo interesse numa ordem especial de verdades e julgar
que isso é o que convém à igreja, mas podemos equivocar por completo. Se é a verdade
o que nos interessa, então o que temos que apresentar é a verdade que responde às
necessidades da igreja, e para fazê-lo é necessário esperar constantemente no Senhor
de toda graça. Deveríamos fixar nossos olhos nEle, com tenacidade e com simplicidade,
e dizer-lhe: “Senhor, que queres que eu diga aos teus santos amados? Dá-me a mensagem
que lhes convém”. Assim o Senhor se servirá de nós como seus canais; a verdade fluirá
do seu amado coração aos nossos, e dali se derramará nos corações dos seus, segundo
o poder do seu Espírito.
Oxalá
que isto fosse assim para todos os que falam e escrevem para a Igreja de Deus! Que
resultados poderíamos esperar! Que poder, crescimento e progresso manifesto na
vida divina se veriam! Os verdadeiros interesses do rebanho de Cristo seriam os
objetivos de tudo o que se diz e escreve. Não haveria nada equivocado; não se apresentaria
nada estranho nem nada que cause sobressalto ou assombro. Dos lábios ou das penas
só brotaria o que é são, sóbrio e oportuno. Só se ouviriam “sãs palavras” (1.ª Timóteo
6:3; 2.ª Timóteo 1:13), que não podem ser condenadas; e se apresentaria unicamente
o que é bom para a edificação.
Que
em toda a Igreja de Deus cada obreiro se aplique a si mesmo a advertência do apóstolo:
“Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina (ensino)... pois fazendo isto, te
salvarás a ti mesmo e aos que te ouvem.”
“Recorda-lhes
isto, exortando-lhes diante do Senhor a que não contendam sobre palavras, o que
para nada aproveita, senão que é para perdição dos ouvintes. Procura com
diligencia apresentar-te a Deus aprovado,
como obreiro que não tem de que se envergonhar, que usa bem a palavra da verdade”
(2.ª Timóteo 2:14-15)
C. H. Mackintosh
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