“IRMÃOS SANTOS”
“Portanto, irmãos santos, participantes da
vocação celestial, considerai ao apóstolo e sumo sacerdote de nossa confissão, Cristo
Jesus” (Hebreus 3:1)
“E consideremo-nos
uns aos outros para nos estimular ao amor e as boas obras” (Hebreus 10:24).
Estas duas passagens têm entre si uma relação
muito íntima. Isto se deve ao fato que o autor inspirado da epístola emprega em
ambas uma mesma palavra, que não é encontrada ao longo deste maravilhoso
tratado, a não ser nestes dois lugares.
Nós somos convidados a considerar Jesus e, ao mesmo tempo, a todos aqueles que lhe
pertencem, onde quer que se estejam. Estas são as duas grandes divisões de
nossa obra. Devemos aplicar nossa mente diligentemente a Ele e aos seus
interesses na terra, e assim seremos libertados da miserável ocupação de pensar
em nós mesmos e em nossos próprios interesses. Gloriosa libertação,
seguramente, pela qual bem podemos louvar ao nosso glorioso Libertador.
O título de “irmãos santos”
Mas, antes de entrar no exame dos grandes temas que temos para
considerar, detenhamo-nos por um momento no maravilhoso título que o Espírito
Santo aplica a todos os crentes, a todos os verdadeiros cristãos. Ele os chama “irmãos santos”. Este é certamente um título de grande
dignidade moral. Não diz que devemos ser
santos. Não; mas que somos santos.
Trata-se do título ou da posição de todo filho de Deus na terra. Sem dúvida que
ao ter esta santa posição, pela soberana graça, devemos ser santos em nosso
caminho; por isso é mister que nosso estado moral responda sempre a nosso
título. Jamais deveríamos permitir um pensamento, uma palavra ou uma ação que
seja, ainda no menor grau, incompatível com nossa elevada posição como “irmãos
santos”. Santos pensamentos, santas palavras e santas ações é a única coisa que
convém àqueles a quem a graça infinita de Deus tem concedido este título.
Não o esqueçamos. Não digamos, não pensemos jamais que não podemos
manter tão elevada posição ou viver a altura desta medida. A mesma graça que
nos tem revestido desta dignidade, nos fará sempre capazes de mantê-la, e,
veremos em continuação destas linhas, como esta graça atua, de que poderosos
meios morais ela se vale, para produzir um andar prático que esteja em harmonia
com nosso santo chamado.
Porém examinemos sobre que base a epístola fundamenta este título de
“irmãos santos”. É de suma importância ver claramente esta questão. Se não
vemos que é inteiramente independente de nosso estado, de nosso caminho, ou de
nosso progresso, não poderemos compreender, nem nossa posição, nem seus
resultados práticos. Afirmamos com a maior segurança que o caminho mais santo
que se tem visto neste mundo, o mais elevado estado espiritual que tem sido
alcançado, jamais poderá constituir a base de uma tal posição, como a que
expressa este título: “irmãos santos”. E mais, nos atrevemos a afirmar que a
própria obra do Espírito Santo em nós, tão essencial como é em cada etapa da
vida divina, tampouco poderia dar-nos direito a entrar em tal dignidade. Nada
em nós, nada de nós, nada concernente a nós, poderá jamais constituir o
fundamento desta posição.
Em que, pois, se fundamenta? Hebreus 2:11 nos fornece a resposta:
“Porque o que santifica e os que são santificados, são todos de um ; pelo que não se envergonha de chamar-lhes
irmãos.” Aqui temos uma das verdades mais profundas e mais extensas do santo
volume. Vemos como chegamos a ser “irmãos santos”; isto é, sermos associados
com Aquele bendito que desceu á morte por nós, e que em sua ressurreição veio a
constituir o fundamento desta nova ordem de coisas onde temos nosso lugar. Ele
é a Cabeça, o chefe desta nova criação, à qual pertencemos, o Primogênito entre
muitos irmãos, dos quais não se envergonha, visto que os tem posto sobre o
mesmo terreno que Ele, e os tem trazido a Deus, não só segundo a perfeita
eficácia de sua obra, mas segundo a perfeita aceitação e a infinita
preciosidade de sua pessoa diante de Deus. “O que santifica e os que são
santificados, são todos de um.
Palavras maravilhosas! Meditemo-nos nelas, querido leitor. Notemos a
profunda, sim, a incomensurável diferença que existe entre “o que santifica” e
“os que são santificados”. O Senhor, pessoalmente, de uma maneira intrínseca,
em sua humanidade é “o que santifica”. Nós, pessoalmente, em nossa condição
moral, em nossa natureza, temos necessidade de ser santificados. Porém - o
universo inteiro louva seu Nome pela eternidade! - é tal a perfeição da sua
obra, tais são as “riquezas” e “a glória” da sua graça, que pode ser escrito:
“Como é Ele, somos nós neste mundo.” “O que santifica e os que são
santificados, são todos de um” (1.ª João 4:17; Hebreus 2:11). Todos estão sobre
um mesmo terreno, e isso para sempre.
Nada pode ultrapassar a grandeza deste título e esta posição. Estamos
diante de Deus segundo todos os gloriosos resultados da sua obra perfeita e
segundo toda a aceitação de sua Pessoa. Ele nos tem unido consigo, em sua vida
de ressurreição, e nos tem feito participantes de tudo o que tem e de tudo o
que é como homem, salvo sua Deidade, naturalmente, que é incomunicável.
Prestemos particular atenção no que implica o fato de que necessitamos ser “santificados”. Isso
põe de manifesto, da maneira mais forte e clara, a ruína total sem esperança e
absoluta em que se acha cada um de nós. Não importa, no que toca a este aspecto
da verdade, quem éramos, e o que somos em nossa vida pessoal e prática.
Poderíamos ter sido refinados, cultos, amáveis, morais e religiosos à maneira
dos homens; ou em contra partida poderíamos ter sido degradados, imorais,
depravados, a escória da sociedade. Em uma palavra, poderíamos haver estado,
quanto ao nosso estado moral e a nossa condição social tão longe uns dos
outros, como os dois pólos; todavia, como se trata da necessidade de sermos
santificados, não há evidentemente “nenhuma diferença, nem para o mais
excelente, assim como para o pior, antes de sermos chamados “irmãos santos”,”O
mais vil não necessitava nada mais, e nem nada menos que o melhor. Todos, e
cada um de nós estávamos envoltos na mesma ruína comum e tínhamos necessidade
de ser santificados, postos aparte, antes de poder tomar nosso lugar entre os
“irmãos santos”. E agora, postos a parte, estamos todos sobre um mesmo terreno;
O mais débil filho de Deus sobre a face da terra forma parte dos “irmãos
santos” tão verdadeira e realmente como o apóstolo Paulo mesmo. Não é questão
de progresso nem de logros, por importante e precioso que seja fazer
progressos; trata-se, simplesmente, de nossa comum posição diante de Deus, da
qual o “Primogênito” é de uma maneira viva, em sua pessoa, a eterna e preciosa
definição.
Porém devemos recordar aqui ao leitor que é da maior importância ter
isto bem claro e estar bem fundados quanto à relação do “Primogênito” com os
“muitos irmãos”. É esta uma verdade fundamental, com respeito a qual não deve
haver nenhuma oscilação, nem indecisão. A Escritura é clara e enfática sobre
este grande ponto principal. Contudo há muitos que não querem ouvir a
Escritura. Estão tão cheios de seus próprios pensamentos que não tomam o
cuidado de esquadrinhar as Escrituras para ver o que dizem sobre este tema. Por
isso hoje encontramos muitos que sustêm o erro fatal de que a encarnação
constitui o fundamento de nossa relação com o “Primogênito”. Os tais consideram Aquele que se encarnou como nosso “irmão
maior” que, ao tomar sobre si uma natureza humana, nos uniu a Ele ou ele se
uniu a nós.
Seria difícil expressar convenientemente e enumerar as terríveis consequências de tal erro. Em primeiro lugar, traz junto consigo uma positiva
blasfêmia contra a Pessoa do Filho de Deus; é a negação de sua humanidade
absolutamente pura, sem pecado, perfeita. Em sua humanidade, era tal que o anjo
podia dizer à virgem Maria: “O Santo Ser que nascerá, será chamado Filho de Deus”
(Lucas 1:35). Sua natureza humana era absolutamente santa. Como homem, não
conheceu pecado. Foi o único homem na terra de quem se podia dizer isto. Era
único, absolutamente só nessa condição. Não havia nem podia haver nenhuma união
com ele em sua encarnação. Como o Santo e os profanos, o Puro e os impuros, o
Imaculado e os maculados podiam ser unidos alguma vez? Isso era absolutamente
impossível! Aqueles que pensam e dizem que tal coisa era possível, erram
grandemente, ignorando as Escrituras e o Filho de Deus.
Além disso, aqueles que falam de união na encarnação são manifestamente
inimigos da cruz de Cristo. Com efeito, que necessidade haveria da cruz, da
morte ou do sangue de Cristo, se os pecadores pudessem estar unidos a Ele em
sua encarnação? Nenhuma,
seguramente. Não haveria nenhuma
necessidade de propiciação, nenhuma necessidade de propiciação, nenhuma
necessidade dos sofrimentos e da morte de Cristo como substituto, se os
pecadores pudessem estar unidos a Ele sem isso.
Daí podemos ver que tal sistema de doutrina não pode vir senão do
inimigo. Desonra a pessoa de Cristo e põe de lado sua obra expiatória. Além de
tudo isto, tal doutrina lança fora o ensino de toda Bíblia a respeito da ruína
e da culpa do homem. Em suma, destrói completamente todas as grandes verdades
fundamentais do cristianismo, e não nos deixa senão um sistema profano, sem
Cristo, e infiel. Este é o objetivo que o diabo sempre teve em vista, e que
ainda persegue; e milhares que se denominam mestres cristãos atuam como seus agentes
nos seus esforços de desacreditar o cristianismo. Que tremenda responsabilidade
para eles!
Prestemos ouvidos com reverência ao ensino das Santas Escrituras sobre
este grande tema. Que significado tem essas palavras que brotaram dos lábios de
nosso Senhor Jesus Cristo e que Deus o Espírito Santo as tem preservado: “Se o
grão de trigo caindo na terra não morrer fica ele só” (João 12:24)? Quem é este
grão de trigo? Ele mesmo, Bendito seja seu santo Nome. O Senhor Jesus devia
morrer, a fim de “produzir muito fruto”. Para acercar-se de “muitos irmãos”,
devia descer à morte, a fim de remover todo obstáculo que impedisse que eles
fossem eternamente associados com ele no novo terreno da ressurreição. Ele, o
verdadeiro Davi, devia avançar só contra o temível inimigo, a fim de ter o
profundo gozo em compartilhar com seus irmãos os despojos, frutos de sua
gloriosa vitória. Eternas aleluias sejam dadas a seu Nome sem igual!
No capítulo 8 do evangelho de Marcos temos uma formosíssima passagem que
se relaciona com nosso tema. “E começou a ensinar-lhes que importava que o
Filho do Homem padecesse muito, e que
fosse rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos escribas, e que fosse morto, mas que depois de três
dias, ressuscitaria. E dizia abertamente estas palavras. E Pedro o tomou aparte
e começou a repreendê-lo.” Em outro evangelho, vemos o que Pedro lhe disse:
“Senhor, tem compaixão de ti; de nenhuma maneira isto te acontecerá.” Agora,
prestemos atenção na resposta e na atitude do Senhor: “Mas Ele, virando-se e
olhando para os seus discípulos,
repreendeu a Pedro, dizendo: Retira-te de diante de mim, Satanás; porque não
compreendes as coisas que são de Deus, mas as que são dos homens.”
Isto é de uma beleza perfeita. Não só apresenta à inteligência uma
verdade, mas deixa penetrar no coração um brilhante raio da glória moral de
nosso adorável Senhor e Salvador Jesus Cristo, com o expresso propósito de
inclinar a alma em adoração diante dEle. “Virando-se e olhando para os seus discípulos”, é como se houvesse querido
dizer ao seu errado servo: «Se admito o que me sugeres, se tenho compaixão de
mim mesmo, o que será destes?» Bendito Salvador! Ele não pensou em si mesmo.
“Manifestou o firme propósito de ir a
Jerusalém” (Lucas 9:51), sabendo muito bem o que ali o esperava. Ia a cruz para
sofrer ali a ira de Deus, o juízo do pecado, todas as terríveis consequências
de nossa condição, a fim de glorificar a Deus com respeito aos nossos pecados,
e iso, a fim de ter o gozo inefável e eterno de ver-se rodeado de “muitos
irmãos” a quem, sobre o terreno da ressurreição, podia anunciar o nome do Pai. “Anunciarei o teu nome a meus irmãos.”
Do meio das terríveis sombras do Calvário, onde suportava por nós o que nenhuma
criatura inteligente pudesse jamais sondar, Ele olhava adiante, para este
momento glorioso. Para poder chamar-nos “irmãos”, Ele devia encontrar só a morte e o juízo por nós.
Pois bem, por que todos estes sofrimentos, se a encarnação fosse a base
de nossa união ou de nossa associação com ele? Não é perfeitamente evidente que não poderia haver nenhum
vínculo entre Cristo e nós exceto sobre a base de uma expiação cumprida? Como
poderia existir este vínculo, com o pecado não expiado, a culpabilidade não
apagada e os direitos de Deus não satisfeitos? Seria absolutamente impossível.
Manter semelhante pensamento é andar na contra mão da revelação divina,
enterrar os mesmos fundamentos do cristianismo, e isto é precisamente, como bem
sabemos, o objetivo do diabo.
No entanto, não nos deteremos mais neste tema aqui. Acreditamos que a
grande maioria dos leitores estejam perfeitamente convencidas disto e firmadas
neste ponto, e que o sustenham como uma das verdades principais e essenciais do
cristianismo. Mas em um tempo como o presente, sentimos a importância de dar a
toda a Igreja de Deus um claro testemunho desta tão bendita verdade. Estamos
persuadidos de que o erro que temos combatido - a saber, a união com Cristo na
encarnação - forma uma parte integrante de um vasto sistema infiel e
anticristão que domina sobre milhares de cristãos professantes, e que faz
tremendos progressos em toda a cristandade. É a profunda e solene convicção que
temos deste fato, o que nos conduz a chamar a atenção do amado rebanho de
Cristo sobre um dos mais preciosos e gloriosos temas que pode ocupar nosso
coração, a saber, o título de sermos chamados “irmãos santos”.
A exortação dirigida aos “irmãos santos”
O Apóstolo de nossa confissão.
Nos deteremos agora por uns momentos à exortação dirigida aos “irmãos
santos, participantes da vocação celestial”. Como já temos observado, não somos
exortados a ser “irmãos santos”,
somos feitos tais. Este lugar e esta porção são nossos em virtude de uma graça
infinita, e sobre esta graça o escritor aos Hebreus baseia sua exortação: “Por
isso, santos irmãos, que participais da vocação celestial, considerai,
atentamente, o apóstolo e sumo sacerdote de nossa confissão, Jesus.”
Os títulos outorgados aqui ao Senhor Jesus, o apresentam aos nossos
corações de uma maneira muito maravilhosa. Descrevem todo o curso da sua
história: desde o momento em que estava no seio do Pai até descer ao pó, no
sepulcro, e dali ao trono de Deus. Como Apóstolo, veio de Deus até nós, e como
Sumo Sacerdote voltou a Deus, onde está por nós. Veio do céu para revelar-nos a
Deus, para expor diante de nós o coração de Deus, para fazer-nos conhecer os
preciosos segredos que estavam em seu seio. “Havendo Deus antigamente falado
muitas vezes, e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos
dias nos falou pelo Filho [en uiô =
no Filho], a quem constituiu herdeiro de tudo, e por quem fez também o universo; o qual, sendo o
resplendor de sua glória, e a expressa imagem da sua substância, e sustentando
todas as coisas pela palavra do seu poder, havendo feito por si mesmo a
purificação de nossos pecados, assentou-se a destra da majestade nas alturas”
(Hebreus 1:1-3).
Que maravilhoso privilégio que Deus tem revelado a nós na pessoa do
Senhor Jesus Cristo! Deus falou-nos pelo Filho. O Apóstolo da nossa confissão
nos tem dado a plena e perfeita revelação do que Deus é. “Deus nunca foi visto
por alguém. o Filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer.”
“Porque Deus, que disse que das trevas resplandecesse a luz, é quem
resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de
Deus na face de Jesus Cristo” (João 1:18; 2.ª Coríntios 4:6).
Tudo isto é de um preço inestimável. Jesus tem revelado Deus às nossas
almas. Não poderíamos conhecer, absolutamente, nada de Deus se o Filho não
tivesse vindo e não nos houvesse falado. Mas - graças e louvores sejam dados ao
nosso Deus! - podemos dizer com toda a certeza possível: “Sabemos que o Filho de Deus é vindo, e nos deu entendimento para
conhecermos o que é verdadeiro; e no que é verdadeiro estamos, isto é, em seu
Filho Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus, e a vida eterna” (!.ª João 5:20).
Se recorrermos ás páginas dos quatro evangelhos e contemplarmos Aquele bendito
que o Espírito Santo nos apresenta em todo o resplendor de sua soberana graça,
dessa graça que brilha em todas as suas palavras, seus atos, e em seus
caminhos, podemos dizer: Eis aí a Deus. Vemo-lo indo de lugar em lugar fazendo
o bem, e curando a todos os que estavam oprimidos pelo diabo; vemo-lo curando
aos enfermos, purificando os leprosos, abrindo os olhos dos cegos e as ouvidos
dos surdos, alimentando aos que tinham fome, enxugando as lágrimas das viúvas, chorando
diante do túmulo de Lázaro, e dizemos: Este é Deus. Todos os raios da glória
moral que brilharam na vida e no ministério do Apóstolo da nossa confissão,
eram a expressão de Deus. Ele é o resplendor da glória divina e a imagem, ou
expressão exata, de sua substância ou essência divina.
O Verbo eterno és tu;
O unigênito do Pai,
Deus manifestado, Deus visto e ouvido,
O Amado do céu.
Em ti, perfeitamente expresso,
Do Pai mesmo, o resplendor.
A plenitude da Deidade,
O Bendito, eternamente Deus.
Quão
infinitamente precioso é tudo isto para nossas almas! Ter a Deus revelado na
pessoa de Cristo, de maneira que podemos conhecer-lhe, regozijarmos nEle,
encontrar todas as nossas delicias nEle, Chamar-lhe “Aba Pai”, andar na luz de
sua bendita face, ter comunhão com Ele e com seu Filho Jesus Cristo, conhecer o
amor do seu coração, o amor mesmo com que ama ao Filho, que profunda bênção!
Que plenitude de gozo! Como poderemos louvar e bendizer suficientemente ao Deus
e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo pela maravilhosa graça que demonstrou para
nós, ao introduzir-nos em tal esfera de bênçãos e privilégios, e ao colocar-nos
em tão maravilhosa relação consigo mesmo no Filho do seu amor! Oh, que nossos
corações o louvem! Que nossas vidas o glorifique! Que o único grande objeto de
todo nosso ser moral seja magnificar seu Nome!
O Sumo Sacerdote da nossa confissão.
Examinemos agora outra divisão importante de nosso tema. Temos que
considerar o “sumo sacerdote da nossa confissão”. Isto também está repleto das
mais ricas bênçãos para cada um dos irmãos santos. O mesmo Bendito Senhor que,
como Apóstolo, desceu de Deus até nós, para nos revelar-lhe, voltou a Deus a
fim de estar diante dEle por nós. Veio falar-nos de Deus, e voltou para o céu,
para falar de nós a Deus. Comparece por nós diante da face de Deus. Nos leva
continuamente sobre seu coração. Nos representa diante de Deus, e nos mantém na
integridade da posição em que sua obra expiatória nos tem introduzido. Seu
bendito sacerdócio é a provisão divina para nossa senda no deserto. Se só fosse
questão de nossa posição ou de nosso título, não teríamos necessidade de
sacerdócio; mas como se trata de nosso estado atual e de nosso caminho prático,
não podemos dar um só passo se não tivermos nosso grande Sumo Sacerdote vivendo
sempre por nós na presença de Deus.
Assim, a epístola aos Hebreus nos apresenta três preciosíssimas fazes do
serviço sacerdotal do Senhor. Em primeiro lugar, lemos no capítulo 4: “Visto
que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos
céus, retenhamos firmemente a nossa confissão. Porque não temos um sumo
sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como
nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado”.
Leitor cristão, não é uma preciosa e imensa bênção ter à destra da
Majestade nos céus, Àquele que se
compadece de nossas debilidades, que experimentou todas as nossas dores,
que sente por nós e conosco em todos os nossos exercícios da alma, nossas
provas e nossas dificuldades? Que inefável bênção é ter no trono de Deus um
Homem que tem um coração humano perfeito, com o qual podemos contar em todas
nossas fraqueza, nossos fardos e nossos conflitos; em todas as coisas, mas, em
uma palavra, sem pecado!. Com este último, o pecado – Bendito seja seu Santo
Nome - Ele não pode ter nenhuma simpatia.
Que pena, que língua humana, seria capaz de descrever digna e plenamente
a profunda bênção que resulta do fato de termos na glória um Homem cujo coração
está conosco em todas as provas, em todas as dores de nossa senda pelo deserto?
Que preciosa provisão! Que divina realidade! Aquele que tem toda poder nos céus e na terra, vive agora por
nós no céu. Podemos contar com Ele em todo tempo. Toma parte em todos os nossos
sentimentos, como nenhum amigo na terra poderia fazê-lo. Podemos recorrer a Ele
e dizer-lhe coisas que não diríamos ao nosso amigo mais intimo na terra. Somente Ele pode
compreender-nos perfeitamente.
O
nosso grande Sumo Sacerdote pode compreender tudo o que nos concerne. Ele
experimentou todas as nossas dores e as provas que o coração humano pode
conhecer. Por isso é capaz de simpatizar perfeitamente conosco, e se compraz em
ocupar-se de nós cada vez que passamos pela dor e a aflição, quando nosso
coração é quebrantado e sufocado sob o peso de angústia que só Ele pode
conhecer plenamente. Precioso Salvador! Misericordioso Sumo Sacerdote! Que nossos corações encontrem suas delicias
em ti, e se apropriem mais e mais das fontes inesgotáveis de consolação e de
gozo que se acham em teu terno amor por todos teus irmãos provados, tentados,
que choram e sofrem aqui embaixo!
Hebreus 7:25 nos mostra outra preciosíssimas parte da obra sacerdotal de
nosso Senhor, a saber: sua incessante intercessão a favor de nós na presença de
Deus. “Por isso pode também salvar perpetuamente aos que por Ele se chegam a
Deus, vivendo sempre para interceder por eles.”
Que poderoso consolo para todos os “irmãos santos”! Que segurança
bendita! Nosso grande Sumo Sacerdote nos leva continuamente em seu coração
diante do trono. Tudo o que concerne a nós está em suas benditas mãos, e jamais
deixará que nada de lo nosso peligre. Vive por nós, e nós vivemos nEle. Nos
levará adiante, em segurança, até o fim. Os teólogos falam acerca «da
perseverança final dos santos»; a Escritura fala da perseverança de nosso
divino e adorável Sumo Sacerdote. Sobre isso ponderamos. Ele nos disse: “Porque
eu vivo, vós também vivereis” (João 14:19). “Se sendo inimigos, fomos
reconciliados com Deus pela morte de seu
Filho - o único meio pelo qual podíamos ser reconciliados --, muito mais,
estando já reconciliados, seremos salvos por sua vida” (Romanos 5:10), digo,
sua vida no alto, no céu. Ele fez a si mesmo responsável – garantiu – por cada
um dos “irmãos santos”, de levá-los direto à glória através de todas as
dificuldades, provas, armadilhas e tentações do deserto. Que o universo inteiro
louve para sempre seu Bendito Nome!
Naturalmente
que não podemos, em tão breve tratado, abordar o grande tema do sacerdócio com
todos os seus detalhes. Não podemos mais do que tratar brevemente dos três
pontos sobressalentes que já mencionamos, e citar, para o leitor, as passagens
da Escritura onde apareciam.
Em
Hebreus 13:15 temos a terceira parte do serviço que o Senhor Jesus cumpre por
nós no santuário celestial: “Portanto, ofereçamos sempre por Ele a
Deus,sacrifício e louvor, isto é, o fruto de lábios que confessam o seu nome.”
Que consolo
é saber que temos diante de Deus alguém que lhe apresenta nossos sacrifícios de
louvor e nossas ações de graças! Quão docemente isso nos anima a levar-lhe em
todo tempo tais sacrifícios! É certo que podem parecer mui pobres, mui magros e
mui imperfeitos; mas nosso grande Sumo Sacerdote sabe como separar o precioso
do vil. Toma nossos sacrifícios e os apresenta a Deus em toda a perfeição do
perfume do bom odor de sua própria Pessoa e de seu ministério. O menor suspiro
do coração, a menor expressão dos lábios, o mais insignificante ato de serviço,
sobe a Deus não somente despojado de toda nossa debilidade e imperfeição, mas
adornado de toda a excelência dAquele que vive sempre na presença de Deus, não
somente para simpatizar e interceder, mas também para apresentar nossos
sacrifícios de ações de graças e de louvor.
Tudo isto está pleno de alento e de consolo. Com quanta frequência temos
que nos lamentar por nossa frieza, por nossa esterilidade, por nossa falta
de vida, tanta privada como em público!
Parece que somos incapazes de fazer algo mais que proferir um gemido ou um
suspiro, entretanto, o Senhor Jesus - e este é o fruto de sua graça - toma este
gemido ou este suspiro, e o apresenta a Deus em todo o valor daquilo que Ele é.
Isto faz parte de seu ministério atual por nós na presença de nosso Deus,
ministério que Ele se compraz em cumprir
- bendito seja seu Nome!—. Ele acha seu gozo em levar-nos sobre seu coração
diante do trono. Pensa em cada um de nós em particular, como se não tivesse mais
no que pensar.
Quão maravilhoso é isto!, mas é mesmo assim. Ele toma parte em todas as
nossas pequenas provas, em nossas dores mais desapreciáveis, em nossos
conflitos e exercícios de coração, como se não tivesse outra coisa em que
pensar. Cada um de nós possui a atenção e a simpatia indivisível do seu grande
e amante coração, em tudo o que possa surgir durante nosso curso ao longo desta
cena de provas e de dores. Ele a percorreu toda. Conhece cada passo do caminho.
Podemos discernir as pegadas bendita de suas pisadas através do deserto, e,
olhando ao alto, para os céus abertos, vemos no trono, a Ele, o Homem
glorificado, contudo, o mesmo Jesus que esteve aqui embaixo. As circunstancias
em que aqui esteve tem mudado, mas não mudaram seu terno coração, amante e
cheio de simpatia: “O mesmo ontem, hoje, e para sempre.”
Tal e, pois, amado leitor cristão, o grande Sumo Sacerdote que somos
exortados a considerar. Realmente,
temos nEle o que responde a todas as nossas necessidades. Sua simpatia e
perfeita; sua intercessão prevalece sobre tudo, e nossos sacrifícios, para Ele
são atos aceitáveis. Bem podemos dizer: “Bastante tenho recebido, tenho a
abundãncia” (Filipenses 4:18 ).
“Consideremo-nos uns aos outros”
E agora, como conclusão, lancemos uma vista à exortação de Hebreus
10:24: “Consideremo-nos uns a outros
para estimularmos ao amor e as boas obras.”
A conexão moral desta passagem com o que nos tem ocupado primeiramente,
é verdadeiramente formosa. Quanto mais atentamente considerarmos ao Senhor
Jesus, mais aptos e dispostos estaremos para considerar a todos os que lhe
pertencem, quaisquer que sejam e onde quer que se encontrem. Mostra-me um homem
pleno de Cristo, e eu vos mostrarei um homem cheio de amor, de solicitude e de
interesse por cada membro do Corpo de Cristo. Assim deve ser sempre. É
totalmente impossível estar perto de Cristo, e não ter o coração cheio dos mais
ternos afetos por todos os que lhe pertencem. Não podemos considerar ao Senhor
Jesus, sem pecerber isto, e, ser conduzidos a serví-los, a orar por eles, a ter
simpatia e respeito por eles de acordo com nossa débil medida.
Se ouvis que alguém fala em alta voz de seu amor por Cristo, de seu
apego a sua Pessoa, do deleite que acha nEle, e, ao mesmo tempo vês que não há
nesta pessoa, nem amor por aqueles que pertencem a Cristo, nem solicitude ou
respeito por eles, nem interesse por suas circunstancias, nem boa disposição
para dedicar tempo e esforço para eles, nem sacrifício de si mesmo por amor
deles, podeis estar seguros de estar na presença de uma profissão vazia e sem
valor. “Conhecemos o amor nisto: que Ele deu a sua vida por nós, e nós devemos
dar a vida pelos irmãos. Quem pois tiver bens do mundo, e, vendo a seu irmãos
necessitado, lhe cerrar as suas entranhas, como estará nele o amor de Deus?
Meus filhinhos não amemos de palavra, nem de língua, mas por obra e em
verdade.” E contudo: “Dele temos este mandamento: Que quem ama a Deus, ame
também a seu irmão” (1.ª João 3:16-18; 4:21).
Estas palavras são saudáveis para cada um de nós. Oxalá que façam marcas
no fundo dos nossos corações. Oxalá que, pela poderosa ação do Espírito Santo,
possamos ser feitos capazes de responder de todo nosso coração a estas duas
importantes e prementes exortações:
Considerar o apóstolo e sumo sacerdote da nossa confissão, por uma parte,
e, pela outra: Considerar uns aos outros!
E recordemos que uma consideração sensata dos uns pelos outros, jamais
revestirá da forma de uma curiosidade indiscreta, nem de uma espionagem inescusável: coisas que não
podem ser consideradas mais do que uma praga e a destruição de toda sociedade
cristã. Não! Devemos fazer o contrário de tudo isto. É a solicitude terna e
amante, que se expressa de uma maneira refinada, delicada e oportuna em todo
serviço realizado, fruto do amor de uma verdadeira comunhão com o coração de
Cristo.
C. H. M.
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