JUSTIFICAÇÃO
PELA FE - (continuação)
MEUS
AMADOS IRMÃOS,
Havendo
apresentado as razões que me conduziram a recusar o ensino comum acerca do tema
da justificação pela fé, pergunto agora, Qual é o ponto de vista escritural
desta doutrina? Eu creio que se conseguirmos desembaraçar dos raciocínios
humanos, tal ponto de vista é tão formoso como simples, e que leva a cruz de
Cristo à proeminência, que mostra mais plenamente o infinito valor dos
sofrimentos e da morte de Cristo e, por conseguinte, o caráter perfeito dessa
salvação que possui o crente em, e por meio da morte e ressurreição de seu grande
Substituto, o Senhor Jesus.
1.
Em primeiro lugar, O SANGUE DE CRISTO é apresentado nas
Escrituras como a base de tudo, ou a causa subministrada de nossa justificação.
Digo, o fundamento sobre o qual Deus pode justificar com justiça aqueles que
creem no sangue precioso, na morte do Senhor Jesus Cristo. Desta maneira nós
lemos - "justificados em seu sangue" (Romanos 5:9). Podemos assinalar
que as palavras no grego são ἐν αὑτοῦ αἷμα, isto é, literalmente "em
seu sangue", significando "no poder" ou "em virtude de seu sangue."
A mesma verdade é ensinada num capítulo anterior, "sendo justificados
gratuitamente por sua graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem
Deus propôs como propiciação (propiciatório) por meio da fé em seu sangue."
(Romanos 3: 24, 25; comparem com Romanos 4: 24, 25; Efésios 1:7; Gálatas 2:16;
1 Pedro 3:18). Temos
que indagar então: de que maneira o sangue de Cristo veio a ser o
terreno de nossa justificação? O sangue fala de uma vida derramada (porque a
vida está no sangue; e é o sangue que faz expiação pela alma - Levítico 17:11),
e por conseguinte, nos fala de morte; e, portanto, nossa pergunta é: De que
maneira a morte de Cristo veio a ser o terreno meritório de justificação? A
resposta é simples. Por causa do fruto do penoso trabalho da sua alma (Isa
53:11). O Senhor Jesus "levou ele mesmo nossos pecados em seu corpo sobre o
madeiro." (1 Pedro 2:24); Ele "padeceu uma única vez pelos pecados, o
justo pelos injustos, para levar-nos a Deus." (1 Pedro 3:18); Ele foi feito
pecado por nós. (2 Coríntios 5:21); Ele é "o Cordeiro de Deus, que tira o
pecado do mundo." (João 1:19; é Ele "a quem Deus propôs como
propiciação (propiciatório) por meio da fé em seu sangue." (Romanos 3:25),
etc. Combinando estas passagens, e outras de similar natureza que se encontram
dispersas através de todas as epístolas, nós descobrimos imediatamente o
caráter da morte do Salvador. Aprendemos que Ele não só levou em forma
substitutiva nossos pecados na cruz, mas que também naquela hora funesta, Ele
esteve diante de Deus sob todo o peso e responsabilidade da condição pecaminosa
do homem; que Ele veio à cena onde o primeiro Adão fracassou, e assumiu todas as
consequências daquele fracasso, e fez provisão de uma solução plena e eterna, por
sua morte na cruz, da questão completa, tanto de nossos pecados (plural) como do
pecado (singular), digo, da condição pecaminosa do homem. Por isso é que lemos
que "Depois de fazer a purificação dos pecados," Ele "assentou à
destra da Majestade nas alturas." (Hebreus 1:3); e lemos também que
"na consumação dos séculos, se manifestou uma vez para sempre, para aniquilar
pelo sacrifício de si mesmo, o pecado "; e que Ele "foi oferecido uma
única vez para levar os pecados de muitos." (Hebreus 9: 26-28).
Concluímos
que o Senhor Jesus, em Sua morte, satisfez e respondeu a todas as exigências da
santidade de Deus, e satisfez estas exigências tão perfeitamente que Deus ficou
totalmente satisfeito; e não apenas isto, Ele não somente levou e expiou
completamente as consequências do pecado e o fracasso do homem, mas Ele também
vindicou a honra de Deus, glorificando-o plenamente acerca daquilo que havia
trazido ruína e desolação à terra. Porque não se trata somente de que o Senhor Jesus
tenha feito a propiciação; mas que Ele fez mais; Ele, mediante a sua morte,
glorificou a Deus em todos os atributos de seu caráter. Desta maneira, falando
de sua morte, Ele mesmo disse, "Agora é glorificado o Filho do Homem, e
Deus é glorificado nele. Se Deus é glorificado nele, Deus também o glorificará
em si mesmo, e em seguida o glorificará." (João 13: 31, 32); e novamente,
"Eu te glorifiquei na terra; consumando a obra que me deste a fazer."
(João 17:4). A ira de Deus foi infligida sobre Cristo na cruz, porque Ele
estava ali como o substituto dos pecadores; porque Ele levou ali nossos
pecados, e foi "feito pecado" (2 Coríntios 5:21). Por isso é que
todas as ondas e as ondas de Deus passaram sobre sua cabeça naquela horrível
hora; sim, as águas entraram em sua alma; e foi sob a pressão da ira que Ele
sofreu, quando o Senhor quis quebrantá-lo, sujeitar-lhe ao sofrimento, fazer da
sua vida uma oferta pelo pecado (Isaías 53:10), que Ele clamou, "Deus meu,
Deus meu, por que me desamparaste" (Mateus 27:46)? Mas (bendito seja seu
nome) Ele esvaziou completamente esse terrível cálice até mesmo as suas maiores
consequências, esgotou todo o juízo de Deus contra o pecado, e fez, dessa
maneira, uma propiciação plena, suficiente, e eterna, e vindicou a sua glória,
devido ao fato que atendeu e satisfez todas as exigências da santidade de Deus,
glorificando-o completamente e para sempre.
2.
Tal foi o caráter da morte de Cristo; e, por isso, seu precioso sangue é de
infinito valor diante de Deus que sobre este fundamento pode perdoar
e justificar o ímpio; sim, pode ser "justo, e o justificador daquele que
tem fé em Jesus" (Romanos 3:26); e, por conseguinte, a
"justiça de Deus" é "para todos os que creem nele" (Romanos
3:22). Digo, “Deus é justo, e justifica na virtude de Cristo. Ele é justo,
porque o pecado foi enfrentado na cruz; o pecado foi julgado por Deus; O Senhor
Jesus Cristo sofreu por causa dele e Ele fez propiciação por ele. Mais que
isso: o Senhor Jesus magnificou de tal maneira a Deus, e glorificou de tal
forma seu caráter, que . . . em lugar da obrigação estar, como estava,
totalmente na responsabilidade do homem, que acumulava uma dívida, à qual jamais
podia pagar, Deus se interpôs agora, e tendo sido magnificado no homem Cristo
Jesus em Sua morte, Ele é agora positivamente justo quando justifica a alma que
crê no Senhor Jesus. É, portando, a justiça de Deus; porque
Deus demonstra ser Ele mesmo justo às petições de Cristo [2]”. Porque Cristo morreu
pelos pecadores; e os que creem estão diante de Deus em todo valor infinito
desse sangue precioso que Ele derramou por eles como seu substituto. Deus, portanto,
perdoa justamente, aceita, justifica a cada crente; essa justiça que fluía para
Cristo, o levantou dos mortos, e o glorificou a Sua destra, se encontra também
com, e abriga todo aquele que crê no Senhor Jesus, e o leva onde Cristo está na
presença de Deus. Não podia ser de outra maneira; porque, já que o sangue
satisfez todas as exigências de Deus, e inclusive o glorificou, todo pecador, no
momento que crê, fica revestido com todo seu infinito valor. É, portanto, em
resposta ao valor do sangue que a justiça de Deus - porque isto deve-se a
Cristo - flui com júbilo, e reveste o pecador com sua própria perfeição, de
modo que em Cristo ele está justificado para sempre diante de Deus. Sim,
ele
é aceito
no Amado.
[2] The Righteousness of God: What is
it? By W. Kelly.
(A Justiça de Deus: Que é? Por W. Kelly.)
Esta
interpretação veremos confirmada se olharmos por um momento a exibição da justiça
de Deus para o próprio Cristo. Ante a perspectiva de abandonar o mundo, Ele pode
dizer (antecipadamente), "Eu te glorifiquei na terra; consumando a obra
que me diste para fazer" (João 17:4). E, pronunciando-se sobre a Sua obra
completada, Ele continua, "Agora pois, Pai, glorifica-me tu, ao teu lado,
com aquela glória que tive contigo antes que o mundo existisse." (João
17:5). Digo, Ele esperava que o Pai o glorificasse por causa do que Ele fez na
terra; e Deus satisfez seu pedido quando Ele o ressuscitou dos mortos, e o
glorificou a Sua própria destra. Portanto, Cristo, havendo suportado o juízo
pelo pecado e pelos pecados, e havendo-o suportado de maneira que satisfez
todas as exigências de Deus, ao ponto de glorificar a Deus em tudo o que Ele é, a
justiça de Deus foi exibida agora ressuscitando ao Senhor Jesus Cristo dos
mortos e glorificando-o a Sua própria destra. Numa palavra, era mérito
do Senhor Jesus Cristo, por causa daquilo que Ele fez como nosso substituto,
que Ele fosse glorificado. E Deus o glorificou; porque "Se Deus é
glorificado nele (Cristo), Deus também o glorificará em si mesmo." (João
13:32); e a justiça de Deus foi vista também na glorificação do Senhor Jesus.
Por isso o Senhor disse que o Consolador convenceria o mundo do pecado, da justiça,
e do juízo; "da justiça, por quanto vou para o Pai, e não me vereis
mais." (João 16:10). Então, a justiça de Deus, neste aspecto, é
Cristo recebido acima na glória a sua destra.
Vamos
estar agora em condições de compreender outro aspecto da verdade. Na segunda
epístola aos Coríntios, diz que os crentes são feitos justiça de Deus em Cristo
(2 Coríntios 5:21). Temos aqui o pensamento adicional da nossa união com Cristo
diante de Deus. Digo, “Deus recebe-nos, justamente em Sua glória, como Ele recebeu
ao Senhor Jesus Cristo; porque Ele nos recebe em virtude da
obra feita por nós - portanto, nos recebe nEle. Nós somos feitos
justiça de Deus nEle; porque ao nos abençoar desta maneira celestial e
gloriosa, ao justificar-nos, Ele torna devidamente efetiva as petições do Senhor
Jesus Cristo nEle. Para nós trata-se de pura graça, mas é igualmente a justiça
de Deus. Aquele que não conheceu pecado, foi feito pecado por nós, para que nós
pudéssemos ser feitos justiça de Deus nEle [3]”.
[3] Collected Writings of J. N.
Darby, vol. VIII. (Escritos
Compilados de J. N. Darby vol. 8.)
Esta
é a verdadeira doutrina da justificação. O fundamento sobre o qual Deus atua não
é a lei - a obediência de Cristo, e o sangue; mas somente o
sangue precioso de Cristo. A justiça de Deus não se fundamenta na
obediência de Cristo na Sua vida na terra, mas é a resposta de Deus ao valor
desse sangue precioso - é tão precioso aos olhos de Deus que ele constitui, em
Sua graça, um direito sobre Ele para que justifique a todo aquele que crê no
Senhor Jesus. Essa justiça foi mostrada primeiramente na ressurreição de Cristo
(pois Ele foi entregue por causa de nossas transgressões, e foi ressuscitado
para nossa justificação), e ao assentar o Senhor Jesus em glória a Sua própria
destra; mostra isto novamente na justificação de cada pobre pecador que vem ao
Senhor Jesus Cristo; e será mostrado, também, ao glorificar a todo crente junto
com Cristo. Daí que podemos dizer também que, por parte de Deus, Cristo nos fez
de fato justiça (1 Coríntios 1:30); e que Ele é o fim da lei para justiça de
todo aquele que crê (Romanos 10:4); porque tudo o que nós temos da parte de
Deus - nossa justificação, nossa glorificação - é em Cristo, e somente em
Cristo.
3.
Raramente necessitamos, neste lugar, assinalar que o princípio de justificação é a
fé - a fé em contraste com as obras e em oposição a elas. Pois não
há nenhuma controvérsia com os Cristãos 'evangélicos' neste assunto. Contudo
podemos chamar novamente a atenção dos leitores ao fato de que a justificação
de Abraão é apresentada como um modelo deste princípio (Romanos 4; Gálatas 3).
Existe, efetivamente, uma bendita diferença; porque o objetivo proposto a
Abraão para fé foi um Deus de promessa; enquanto que a nós é
um Deus de cumprimentos. "Mas não somente
para ele foi escrito que lhe foi tomado em conta (a justiça), mas também a nós,
a quem nos será tomado em conta: aos que cremos naquele que ressuscitou dentre
os mortos, a Jesus nosso Senhor, que foi entregue por causa de nossas
transgressões e ressuscitou para nossa justificação. Justificados, pois, pela
fé, temos paz para com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo."
(Romanos 4: 23-25; Romanos 5:1).
Confiando
que vocês examinarão esta exposição da forma como Deus justifica aquele que crê
em Jesus por meio da luz da Escritura, creia-me, amados irmãos, que vos saúdo,
Afetuosamente
em Cristo.
Edward
Dennett
(Continua...)
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